segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Eco de um grito sem som.

Eu sou um homem de mãos sujas e rosto inchado, pés cansados e costas amargas.
Minhas mãos são sujas de tanto que as limpo. Vivo no conforto, conformado com minhas inúmeras posses e inúmeros números guardados no banco.
Meu rosto é inchado de tanto tapa, tapa que eu mesmo dou em qualquer infeliz que cruzar meu caminho, mas acabo, no fim, recebendo tudo de volta.
Meus pés estão cansados de tanto descansar, e na verdade eu só conto. Conto os contos que vivo no meu imenso vidro fechado, lacrado, em que me tranquei.
As costas amargas, tomadas por descaso e solidão.

A felicidade foi embora há pouco tempo, junto com o Amor que eu guardava ali dentro.
Saiu pela porta da frente sem olhar pra trás...
E na verdade tanto faz, ficar aqui, ou ali atrás.

Vivendo, cantando ou amargando.

Sonhando, apanhando ou morrendo.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Festa no picadeiro

Sabe, eu fico puta com essa história de política.

Exatamente agora tem um bando de gente hipócrita passando em frente a minha casa.

Apitos, barulho, confete. E uma musiqueta que diz: “Do jeito que ta não dá, do jeito que ta não dá”. O que é óbvio.


Só faltava agora, a passeata da oposição vir pelo outro lado da rua e trocarem tomates podres, ovos e palavrões. Ia ser bem engraçado.


Tem uma mulher aqui na cidade, que colocou faixas de todos os candidatos a prefeito na fachada da casa dela. Isso é que eu chamo de voto nulo...

Tem também uma propaganda, de uma candidata a vereadora, na televisão, que é exatamente assim: “Sou a fulana macumbeira, se você não votar em mim eu jogo macumba em você”. Fora a senhora que aparece do nada: “Sou a mulher do sicrano do pó... de café... Ouro verde. Meu número é tal.”

Hum! Sem contar o cara do “Peroba neles”. E meu professor de química que apareceu em rede nacional vestido de Chapolin Colorado.

Na eleição passada teve um que fez sua apresentação montado em um avestruz.


O povo pensa que política é palhaçada.

O povo pensa que gente passando fome é piada.



Vai amigão, se entope mais de ópio, pinga, futebol e televisão...

14 de maio

Reza, reza... pra ver se alguma coisa no mundo melhora...
Reza pra ter força, pra ficar ou ir embora.
Reza por quem ama, por quem reza, por quem não acredita.

Reza pro barco não naufragar, reza pelo marujo, pelo capitão...
Reza pra Flor não sentir sede e secar.
Reza pro Poeta sempre se inspirar.

Reza pro casal que se ama se ajeitar.
Reza, preza.

Reza pra ela passar no vestibular (e ele também).
Reza pra conseguir se concentrar.

Reza, mesmo que com pouca fé.
Quanto mais se tem fé mais se é.
Mais você se apóia, fica de pé.

O mar está pra peixe.
O nosso mar agora é calmo.
O navio tem que continuar a vagar.
Analisando ele de longe, sem saber o que se passa, ou ele está sem rumo
Ou está seguindo o seu caminho.

E nesse caminho há todos os tipos de perigos.
Mas estamos juntos.

Então, o mar está pra peixe.

Reza, reza... pro peixe não fugir, pro medo não surgir.
Pra tempestade não cair.

Seis dias sem vida

Camuflou-se por trás da vida, cor.

Andou junto ao vento, ao relento...

E então a chuva assim se deu.


Os respingos embaçavam os óculos, e tudo ficava fora de foco.

Fora de toque.

Fora de alcance.


Virou de relance, puxou um novelo de lã de dentro da mochila.


Sentou rente ao meio fio, costurou um pulôver.

Ninguém nem viu...


Vestiu, mas não serviu.

Seguiu, subiu, quase caiu.

Enxaqueca

Dói aqui, parece-me que eu não sou mais quem eu sempre fui.

Dói a perda de mim mesmo, dói, e é uma dor que me adoece, me enfraquece.

Dói ter de achar algo que eu pensava que nunca perderia. E eu ria!


Nunca vou perder aquilo que me faz ser assim como eu sou.

Eu pensava, pensava e achava o que eu procurava.

Então um dia, eu perdi o que eu achei que tinha achado, perdi o que eu mantinha em mim, no meu quarto. Perdi porque me traí, me larguei por aí.


Então me surge um alguém que eu não procurava. Alguém que me olhava de longe, e aprovava minhas notas enquanto eu tocava.

Ela cantava uma opereta, jogada na sarjeta... Aparentemente fraca.


Ah! A força! A força e a forca.

A força e a coragem de ir pra forca de cabeça erguida e voz límpida.

A forca, a coragem e a força, o braço forte e o olhar úmido.

A força pra desfazer o laço da forca e me libertar deste embaraço.


Eu ainda tenho o que havia procurado? Ainda tenho o que havia achado? Ainda tenho o que procurava achar que havia perdido? Ainda tenho o que eu achava procurar pra tentar não perder?


Eu posso ver?

Posso saber?

Posso?

Será que eu permitiria tal honraria?


Hoje me deito ao relento, penso, lento, acalento, sinto o vento, tento...


“Olá, você sabe que horas são, meu irmão?”


O desconhecido era conhecido por mim mais do que por qualquer um que estivesse ali jogado, cansado de tanto beber rum.

Era eu. Era quem eu havia largado graças ao agrado que devia ser dado.


“Pois saiba, meu caro, que não há nada que me agrade mais que você mesmo. Pois então não mais me largue, não mais se largue... Por favor, o tempo está tão frio, e eu aqui! Não rio, não vivo, não sinto, não amo...”.


Acordei, com uma tremenda enxaqueca. Senti o Amor que não mais sentia, senti os salpicos do orvalho, senti a brisa leve que levou todos os meus erros e lavou todas as minhas lágrimas.


Entendi todas as quedas, todos os machucados, toda a hemorragia da alma, entendi a cólera. Entendi o porquê da correnteza em um rio de águas tão claras.


Você só perde quando não aprende com os danos. Enganos.

Você só se engana quando não percebe que o que se Ama jamais se perde.

Mesmo que o tempo leve... Mesmo que a chuva lave.



Mesmo que nenhuma nota acompanhe a clave...


(Para Felipe)

Oito horas da saudade

Bolo de frutas, molho de flores.

De acompanhamento, chá de suspense.

E eu, sentada na cadeira de vida quebrada

Olhando a paisagem de café desenhada

A foto de pão de forma, encapada

Fora na mesa de centro colocada.

A cena de amargura é meu café da manhã.

Então, entorno o leite de solidão,

Adormeço, esqueço...

Enfim desperto.

Não vi meu dia de agonia ir embora

Já são oito horas da saudade, agora

Não posso nem ao menos ver o sol lá fora.

Só ouço o barulho mudo do tom agudo

O amassar do folhetim


E os passos calmos de um alguém, pisando as acácias do meu jardim.

Há pavor, ando...

Eu apalpei meu peito, me poupe, eu não podei o que eu podia podar.

Eu quero querer evitar, quero querer não querer, bem querer.

Eu tenho uma margarida na mão, e na outra um pão com margarina.
Só me falta a xícara de café, forte.
Pra me tirar dessa vida, morte.
Pra me entorpecer e sumir com a dor, corte.
Pra me fazer crescer, porte.
Não se comporte.
Mas não se entorte.



Cansei,
De dormir só pra sonhar.
Se nem o sonho me sacia
Eu quero a paz, quero o dia.
Porque meu sonho é pesadelo
Cansei,
De recorrer ao apelo
De desfazer do apego.

Cadê meu aconchego?

Ponto

Eu não tinha um pergaminho, só um pouco de tinta. Queria contar alguma história, queria ouvir além do choro, sentir por trás da pele, por trás do toque, fazer uma viagem. Sair do meu corpo pra ver outro mundo lá fora. Miragem. Encontrei no meio do caminho, um relógio jogado no chão. Abaixei e vi que ele ainda marcava a hora. Duas e sete, ele dizia. Corri pra ver se dava tempo de pegar o ônibus, mas me lembrei que o tempo não existe. Sentei no meio fio, ora pois, quem resiste? Quem desiste? Depois de ver passar um pouco de encanto, me levantei e fui à padaria. Mentira. Eu nem sei de tirar uma xícara de café...

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

PhD em Vida.

- Olá Doutor! Vim me consultar... Estou com uma tremenda enxaqueca, a carcaça carrega a trapaça e a dor de cabeça está ali, em cima de sua mesa. Esta também tem perguntas a lhe fazer. Fora a dor de dente, e não é cárie não, é nervoso. Escovo os dentes seis vezes ao dia e quebro todas as escovas. Mordo com força, arranco as cerdas macias, não sei se estou certa...Vim suplicar sua ajuda, buscar aconchego e algumas receitas.

- Ora, pois estás fraca, feito uma pluma em meio a avenida. Onde está sua vida? Caíste por quê? Não tens vontades de levantar-te? Tens força? Até onde vais? Até onde lutas? Tu te igualas ao resto dos meus pacientes, aos senhores, ao clero, ao lero... Eu, formado que sou, qualificado que sempre fui e referência que me tornareis, digo que me decepcionaste!

- Mas Doutor, é só uma enxaqueca. Receite um doril e eu prometo que seguirei em direção à porta de saída (e de entrada) para não mais voltar.

- Ó moça, por que tão frágil? Deixarás que uma pequena pedra desvie seu caminho? Não pensei que fosses assim, digo que me decepcionaste!

- Mas... mas... Doutor...



quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Índole há em si já.

Soa como uma brincadeira de criança, soa leve, soa cedo.
Soa terno, eterno, soa, voa, vento, leva.
Neva.

Neva e congela por dentro, ela não dá mais trela e não revela.
Não revela que por baixo de sua experiência maquiada não há quase nada.

Quase nada ao ver dela.

Porque ser ela ninguém consegue.
Pois tal proeza não se vê em qualquer mesa.
Pois tal prosa não se vê em qualquer fossa.
Não se vê, mas se vai...

Segue, segue sentindo, amando e sorrindo.
Segue sem medo, segue o enredo.
Estraçalhe a vanglória, faça a sua história.
Use seu compasso a cada passo.


Porque não há nenhum outro como o seu caso.