quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Não vou escrever mais nenhum verso ao pensar em seus olhos exalando verdade, em seu sorriso que dizia o que eu sempre quis ouvir, em sua forma de me incluir na conversa da roda de nossos amigos. Não vou mais expressar quão encantada fiquei desde a primeira vez. Nem vou citar, nem vou cogitar citar que minhas gargalhadas foram as mais soltas, tal qual numa dança. Tão livre e ao mesmo tempo tão ensaiada... Daquelas que eu sei que você sabe que faço embaixo de chuva.
Cheguei a acreditar que eu era diferente, que você era diferente, que seríamos diferentes juntos.

E fui embora, dessa vez olhando pra trás a cada passo dado. O rastro passou a ser apenas um recado disfarçado na cômoda abarrotada ao lado da cama:
"Ainda espero a resposta da pergunta que nem cheguei a lhe fazer."

sábado, 22 de janeiro de 2011

Ontem eu saí. Estava em casa, fui comprar bebida, voltei, bebi, me arrumei, bebi e saí.

Saí como quem sai de si pra procurar algo por lá. Ali fora era frio e tudo o que eu via escapava dos meus olhos. A cada compasso um grupo puxava o foco, num jogo cênico involuntário.

Não faz sentido algum desejar a superfície. Eu passava e aqueles homens passeavam as mãos na minha barriga, pegavam no meu braço, murmuravam meias palavras numa disputa carnal que parecia valer a vida. E valia. Valia o ego e isso pra eles era um inteiro.

Me deu saudade de me sentir desejada por dentro, saudade da conquista, dos começos, dos meios e dos recomeços. Me deu saudade da saudade. Da espera, dos suspiros, dos atrasos, dos descasos, do desgaste.


Cheguei a suplicar pela despedida.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Destilei minha piedade. Gritei. Ela abriu os olhos.
Continuei arranhando o antebraço, pra que sentisse minhas unhas afiadas. A mordaça começava a sufocar. Abafadas, as súplicas não me pareciam audíveis. Que pena.
Vai ter que continuar amordaçada, sem dizer o que precisa. Você não diz o que sente, não pode. Não me venha com esse ar de gente que sente. VOCÊ NÃO SENTE. Não aprendeu o que ensinei, é isso que acontece com quem não faz lição de casa.
Lembrei da lança de cobre afiada exposta na sala, porque eu gosto de ostentar. Doze passos daqui até lá. Encarei aquele rosto, macio, os cabelos cheirando a romã. Saí me enroscando por entre as paredes, por entre as lembranças, me enroscando até chegar onde eu queria. Agora faltam sete. Me curvo diante do que me parece reverenciável, diante do sangue, da dor, da lágrima quente que escorria daqueles olhos castranhos. Não me dei por satisfeito, ela estava quieta demais. Ameaça é coisa de gente fraca. Inocente. De gente que sente e acorda com a certeza de que todo mundo sente a mesma coisa... Idiotas. A ferida aberta da perna direita me chamava atenção. Não pude resistir, precisava cavar a dor, precisava fazer com que ela soubesse da metade do que passei depois que fechamos a caixinha de música. Fiz duas cicatrizes nas maçãs do rosto, bem fundas.



Que é pra ela nunca me esquecer.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Um quadro em preto e cinza ocupava a parede principal do quarto vazio. O inverno de uma cidade distante me beijava e dizia boa noite sempre as 9:38, após lavar bem as mãos. Mania. Ajoelhava, com o terço apanhado e suplicava proteção. Enquanto o sereno, sempre sutil vinha deixar a alma ainda mais fria. O coração, a bater bem fraquinho, já não tinha cor. Tal qual o quadro. Faltava um amarelo ouro, azul piscina, rosa, vermelho, verde e o tom alaranjado pra finalizar o nascer do sol que não nascia. Porque era inverno. Era inverno em uma cidade distante e o filme que passava era o mesmo, todos os dias.