sábado, 12 de setembro de 2009



Eu fico com as asas.
Quem nunca tira os pés e os olhos do chão, por mais que saiba em que terreno pisa, não consegue sentir o céu. Descobrir que aquele azul na realidade tem um nome, e que a imensidão é absurdamente ilimitada. Como os caminhos a seguir, como a (in)sanidade. Como o silêncio, as nuvens e os sonhos. Como toda e qualquer dúvida, como a simplicidade de um doce toque entre duas mãos. Como dados de mil faces, como os números e como tudo o que não se deve revelar.
Divirto-me entre as marquises. Ah! Ilustre sonho, majestosa vontade, delirante saudade.


Equilíbrio desajustado, destino destraçado, distúrbio irrevogável.
Xícara de barro, café gotejante, queijo mineiro e um banquete inteiro a servir.
Creme sabor pêra, corpo livre, pele macia.
Um desejo incontrolável de saciar o que não se sacia.
Olhares e sentidos, sentidos sete vezes com todas as capas e cartas na mesa.

Ajustar duas balanças, traçar um caminho novo, desalinhar a sanidade.
Caixa mágica, silêncio inquietante, bolo de nuvem e suco de sonhos.
Geléia do sabor que quiser, vento frio, alma quente.
Uma saudade incontrolável do futuro presente.
Suposições e mãos dadas, dados de mil faces sem nenhum número a revelar.


Mas cá entre nós... Se te dissessem "ou a ponte ou as asas", o que escolheriam?

quinta-feira, 10 de setembro de 2009


Sem nem ousar minutar
desceu as escadas com a faca e o queijo na mão
Tem esse desespero, treme, teme, afoga ao respirar
devaneando pela solidão,
enternecendo cada ladrilho que pisa
enobrecendo o novo encanto...
Chega a provocar espanto
em uma, duas e até três daquelas balizas.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Ambiente: a mesma sala arejada com sua poltrona vermelha e seu criado-mudo.
Data: 09 de setembro de 2009.

Situação: Uma mulher beirando seus 42 anos, revoltada com a indecisão de alguns jovens que não sabem aproveitar a vida que o amor tem pra dar.

"Nunca fui de regular sentimento, não. Eu sempre tive Amor em mim, mesmo que 'os amores' saíssem pela mesma porta que entraram. Era bem intensa. Quando estava feliz, eu estava mesmo. Quando triste, desabava. Parecia que meu problema era o maior do mundo. Depois fui descobrindo que o problema é o mundo, em carne, osso e emoção. Uma loucura! Escasso, tudo muito escasso. Olhava pro espelho, roubava um batom da bolsa e já ia escrevendo meio verso livre. Hoje eu fico aqui, sentada fumando meu Djarum Black, cigarro de frutinha. Entre uma tragada e outra, revelo mais uma face que me habita. E eu garanto pra vocês, todas elas amam. Todas elas espalham amor junto com a fumaça, até irem desaparecendo e dando lugar pra outra. Nova.
Esse é meu grande segredo. Nunca matar o amor. Você pode ir morrendo, aos poucos. O cigarro pode te ajudar nessa etapa... Câncer de pulmão, dentre fraco, amarelado. É, o sorriso é primordial pra manter-se vivo, pode anotar o que digo. Apesar de aparentemente ser só mais uma desocupada, apesar de aparentemente sempre ter sido só mais uma desocupada, eu amo. Sempre amei e sempre vou amar. Tanto tipinho aí, que trabalha, estuda e ainda faz natação se achando pleno. Na realidade você pode fazer tudo e pode não fazer nada. Mas se amar, vai se sentir sempre completo."

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Depois de um litro e meio de pinga das boas, vi rodar o meu mundo de uma forma que jamais tinha visto - como no carnaval, em que se espatifam carros em milhares de pedacinhos naquelas curvas do sul de Minas.

Desço, rebolando, até sentar e bater a cabeça no rodapé.
Desço, descascando o esmalte, arranhando o salto no chão, desamarrando o cabelo, borrando o batom
Desço e limpo o canto da boca, reclamo pra vida, enlouqueço as paredes, desço e me sinto oca
Oca dos pés a cabeça, e eu nem desconfiava... Jurava que a vida era plena, que por onde pisava era plano, e agora plano por entre as nuvens de um céu que não tenho.

É estupenda a maneira com que regem a nossa cegueira. Vi o par de olhos que não nasceram em mim brilhando há duas semanas, vi dois braços que um dia cobriram meus dias dançando por entre as madeixas que escondem minhas idéias. Vi meu sorriso em sintonia com aquelas maçãs do rosto, vermelhamente envergonhadas. Vi mas não vi. Talvez tenha sido um sexto sentido sentido por engano. Talvez ainda exista um pouco de lirismo por baixo dos panos. Talvez seja apenas meu vitiligo disfarçado em meio à tantos vestidos. Talvez seja veludo, cetim, seda, linho, veludo, cetim, seda e linho em cada linha dos meus sonetos imperfeitamente metrificados. Talvez, por licença poética, eu possa ser o gótico, o tóxico e o indevido. Uma salada totalmente sem nexo. Um espelho extremamente sem reflexo.
Como saber se vi, senti e vivi?

Então subo, tateando, até acordar e tentar ficar em pé.
Subo, saboreando sanduíche de migalomorfa, embebedando ainda mais os meus heterônimos, cambaleando, atirando pedras em quem um dia se atreveu a tentar
Subo e pesco de volta, o meu eu. Declamando meias desgraças, desgraçando minha meia fio oitenta, subo e desço.
Desço entortando o tom, despedindo a clave, confundindo a fusa com a semifusa... Jurava que a vida era viva, que casa era meu porto seguro e agora seguro por entre os fios desencapados que eu mesma deteriorei.