terça-feira, 26 de agosto de 2008

Espião espionado

Um pequeno espião me seguiu e levou embora o que ele viu. O que se viu e se levou, voou, serviu de aviso pro espião desavisado, ora, faz-se louco, desvairado, ao olhar o tablado e perceber que não há ninguém a representar.

Mas a percepção é errada, tem areia, céu, e até estrada em um palco estreito, e o ator impõe respeito de lá de cima, ao dizer que sua rima saiu de dentro do seu eu.

Eu levei o pequeno inocente, frente a tanta gente, gente contente, gente carente, gente doente, e então ele saiu.
Correu, caiu, correu, caiu.

Não mais levantou.

Pois bem, eu esqueci o que não me convém.
E quem ficou, viu, viveu, entendeu, a história pra outro contou?

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A única história sem ponto final



Dois personagens, dois protagonistas, dois roteiristas, dois sonoplastas e um só cenário.

Sejam bem vindos ao meu monólogo a dois.

Hoje eu olho pra frente e não vejo o fim da estrada. Olho ao lado e vejo o amado, com um pergaminho e uma caneta, cantarolando uma opereta.

Pois bem, há tempos que não narro o que se passa em nossa peça.

Houve um dia em que a Flor secou. Houve um dia em que a atriz prometeu não mais tropeçar nas pequenas pedras, e nem nas grandes. Houve um dia em que o Poeta pulou a grade, invadiu o palco e fez plantar em seu quintal a Flor-Amor. Arregaçou as mangas, despiu os pés, pegou a terra, cavou o lugar da Flor. Plantou Amor com todo o Amor que há.
Foi neste dia, que ao acordar, ele abriu a janela pra ver o sol, depois de tanto tempo no escuro do seu eu.
Vivia, escrevia, cantava, agonizava querendo achar, mas sem saber onde procurar. Só tinha o porquê.
Não se pode viver sem Amor, sem um par, sem um lar, ar.

Desde então nada tem sido em vão, engatilhou, pólvora, canhão, ninguém segura não!

Acordo e sinto cheiro de chá de morango, sinto o calor, sinto o Amor.
E o Poeta acorda e sente gosto de chá de morango, sente o calor, sente o Amor.

Sente, por entre as cobertas, a resposta de suas perguntas.
Sente o beijo estalado na testa, e o que me resta?

Resta continuar sem pressa, não esquecer da reza, e nem do que mais se preza.
Resta caminhar por entre as montanhas, e sentir pelas entranhas os sonetos e artimanhas.
Resta narrar, sem medo de errar, sem medo de sonhar, amar e poetar.

Em raiz ar ele plantou. O final ninguém contou, ninguém achou nem procurou.

E o ponto final, pra trás ficou

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Ap(r)endicite

Cite alguns fatores que me façam não crer no amanhã. Vamos! Diga-me!
Apedreja-me, mate-me com suas palavras, afogue-me na sua saliva, enforca-me com seus pensamentos insanos, profanos.
Devora-me com seus dotes. Aperte-me até que meu apêndice estoure, até que meus joelhos se dobrem e se arrastem pelas calçadas malvadas.

Eu andei hoje por todos os lugares carregando uma carga tão pesada quanto três elefantes... Eu olhava a memória interna e via que não havia nada na parte externa. Então eu deixei de lado todo o fardo excessivo, e continuei caminhando, meu amigo.
Parei numa fonte e lavei meus pés. Larguei os sapatos do lado do vaso de flores, cumprimentei a estátua. Mas ela não me respondeu.
Então cite! Cite alguns fatores que me façam não crer no amanhã.

Vou-me embora pra Amsterdã, tomar um chá, degustar um prato típico, típico de quem tem saúde para esbanjar.
Você tem saúde? Tem? Pra tacar em minha face e gritar suas glórias eternas que vão ser esquecidas quando o sol raiar na próxima semana.

As la mañana!

Ora Chico, por que não me levaste em sua bagagem para Budapeste?
Fora um teste, pra saber até onde resisto...
Então lhe afirmo, eu não desisto.

Ora Lucas, por que não me levas para seu quarto, para seu dia, por que não me buscas pelas mãos? Dê-me essa alegria! Permito-lhe a ousadia.
Aguardo este dia...
Que não há de demorar. Só tenho esta garantia.

Entrei em uma sala, onde havia um homem, pouco velho, cabelos grisalhos e a calvície aflorando, mostrando a experiência conquistada, falando e gesticulando feito jararaca. Uma mulher de cabelos inflados, óculos e um chaveiro nas mãos. Balançava as chaves, irritando a todos que entravam e saíam pela porta estreita. Eram três. A do carro, a da casa e a do cofre. O celular tocando, era o marido suplicando sua presença aos gritos, o filho mais novo tinha dor de ouvido.
Apareceu, depois de um tempo, outra mulher. Entrou, procurou, viu, mas não achou. Cara de coruja, blusa vermelha sem decote algum, sapato de salto anos sessenta, papéis sob o braço flácido e uma caneta entre a orelha. Batom marrom, cabelos ruivos. Acaju.

Suco de caju na mesa posta. Eles se serviam de maneira farta. Pão com patê pra vê se alguém consegue esquecê que em outras mesas não há tanta fartura.
Peito de peru defumado, embolorado sobre o prato de porcelana. Café forte, chá fraco, bolo formigueiro, coca cola zero, biscoitinhos de nata, rosca. Muita rosca caseira. Uma garrafa térmica com leite quente, mas sem nescau. Adulto não gosta de nescau...

Então cite! Cite alguns fatores que me façam não crer no amanhã.

Depois que a lua se for, eu vou-me embora. Vou-me embora para o Rio de Janeiro, olhar o mar, olhar meu par, sentar e sentir o luar, os salpicos do mar, os respingos da maré.
Pois é...

Bati de novo naquela porta. Vi o homem velho, a mulher cabeluda e a cara-de-coruja adormecidos.
Entorpecidos pela madrugada, que vem e arranca o que de ruim sobrou na agenda lotada.

Então cite! Cite alguns fatores que os façam não crer no amanhã.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Osmose reversa.

Guerra preciosa
Pedra amolecida
Luta estagnada
Aeroporto vazio
Evolução curvada
Manhattan deserta
O tolo, o bolo e a vanglória
Homem humilde
Amor egoísta

Queda gostosa
Felicidade sofrida
Plenitude esmagada
O perdedor e o poderio
A galinha e a gemada!
Mestria desleixada
Homem humilde
Amor egoísta

Amor egoísta
Homem humilde
Osmose reversa
Sofre pressão
Muda o rumo,
direção.

Amor humilde
Homem egoísta
Osmose reversa
Reverte!
Humilde egoísta
Homem.
Amor.
Osmose...


Reverte?

domingo, 17 de agosto de 2008

Vômito azedo.

Alguém aí vem pra minha festinha particular?
Falem logo, pra eu botar o nome na lista.

Por enquanto só existe um.
O meu.

Ninguém mais quer vir?
A entrada é franca e eu vou ser franca:

Por que você degusta, degusta e degusta, aí vem o tempo e arranca?

Não estou falando nada com nada, devo estar embebedada de tanta agonia.

Ora meu amig ants era alegria,,,
Hoj eu aocrdei... ai olhei la fora e n tinha sol......
Foda ne irmmao. Frio la fora. eu nao tnho roupa.
Dá mais um gole ai fazendol um favr!


Mais uma dose de agonia, e o frio sumia.
Bebida quente...
Desce fervente pela garganta da gente.

sábado, 16 de agosto de 2008

Vida.

Vi dar os maiores passos
Vi levar os piores tombos
Vi dar os maiores laços
Os melhores traços.

Vi cantar o canto mais bonito
(ou) Vi, de longe, o grito mais grave, aflito.

Eu vi, ouvi.
Eu vejo.
Fica aqui meu ensejo
Quero ser o melhor par.

Eu divido com você o sonho
E até os fones dos aparelhos de som
Eu dou valor ao seu tom!

Mas você dá valor à minha cor?
Ou apenas sente o sabor?
Leva contigo o odor?
O calor?

Eu suplico:
Por favor...
Deixa pra trás aquela dor.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Monólogo.

Andava a toa, sem pro lado olhar, sem a frente ver e com medo de morrer.
Fazia cara de mau, unhas grandes, facão e um pedaço de pau.
O carregava nas costas enquanto a chuva regava a culpa. O insulto na porta da boca, esperava a hora de mostrar a fúria. Na cabeça só ódio e lamúria.
Os amigos ele esqueceu há uns sete quarteirões. O cachorro fiel que o seguia fora chutado. Não servia.

Para ele, nada se via e ele nada dizia.

Dirigia-se em direção à orgia, mas sem nenhuma regalia.

Todavia, toda vida, ele não sabia que quem alimenta más intenções não pode entrar pelos portões brancos.

Foi então que passou ao seu lado, ele mesmo.
Preso em um mundo onde já não se pode mais pedir arredo.
Olho no olho, e o olho vermelho servia de espelho para o que se via agora à sua frente.

O outro ele só trazia um pente. E a vontade quente de se libertar daquela gente.
Agora, não se sabe se há vítima.
Pela sétima vez ele chamava a santa.


Até morrer com um rasgo na garganta.

Suco de açúcar.

Esbanja sabor?
O açúcar cobre o gosto da fruta furtacor
Furta o gosto.

E as mãos só sabem colocar mais e mais açúcar.
Falta paz ao rapaz.
Ele adoça e treme.

Treme, treme, treme e teme.
Teme não sentir mais gosto algum.

A fruta estava podre.
Porém, não se sentiu.


Porque o gosto da fruta, o açúcar cobriu.

Dois tipos da mesma espécie.

Homem comum:

Nasce, cresce, se reproduz e morre.

Homem divino:

Nasce, cresce, cresce, cresce, cresce, cresce, cresce, cresce, cresce, cresce...
e diante dos olhos fartos jamais apodrece.

Vida.

Vi dar os maiores passos
Vi levar os piores tombos
Vi dar os maiores laços
Os melhores traços.

Vi cantar o canto mais bonito
(ou) Vi, de longe, o grito mais grave, aflito.

Eu vi, ouvi.
Eu vejo.
Fica aqui meu ensejo
Quero ser o melhor par.

Eu divido com você o sonho
E até os fones dos aparelhos de som
Eu dou valor ao seu tom!

Mas você dá valor à minha cor?
Ou apenas sente o sabor?
Leva contigo o odor?
O calor?

Eu suplico:
Por favor...
Deixa pra trás aquela dor.

Eu tenho a vida inteira.

Tento tento tento
Tento tento Amor
Tento falar tento
Tento dor
Tendo cor
Tento tanto
tempo!
Tento o vento.

Eu tento de todas as formas fazer não faltar tinta no nosso quadro.

No nosso quarto.

"Mundo farto!"

No nosso fardo.

Eu tenho dois minutos.

Tempo tempo tempo

Tempo tempo tento

Tempo tempo tanto

Tempo tempo tenho

Pouco tempo tempo

Tempo tempo tempo

Tempo dor sem pudor

Tempo tempo tempo

Perco tempo tempo

Terra tempo tempo

Ganho tempo guerra

Tempo tempo tempo...

Tem poeira nos meus olhos

Quando eu vejo tempo

Eu tento tanto e tenho

pouco tempo...

Tempo tempo tempo,

Tempo dor sem pudor.

Perco tempo, Terra ganho guerra.

Tem poeira nos meus olhos quando vejo tempo.


Eu tento tanto...

O que é tempo?



(É só uma palavra feia.)

sábado, 9 de agosto de 2008

Por trás da cortina.

Mordaça, trapaça, arregaça a manga, amassa a canga. Prende o ar e cobre o corpo com a cortina cinza.
Desatina com a fina fita branca, enforca as origens, pega o cabelo e o leva até as narinas.

Sente o cheiro e sente muito.

O velório está marcado e um lugar está guardado, no purgatório.

Ouvia um falatório em sua cabeça e uma voz ecoando sozinha. Sussurrando que tinha alguém vendo o atentado, atendo, sangrento.

Eu era a voz, eu era a vítima, eu era quem via.

Se ao menos pudesse contar isso à alguém um dia...



A lágrima quente escorria e tocava a mente que mente.
Mente mas sente. Sente o frio vindo, lento, tomba, morre e é sugado para um lugar onde o fogo queima a alma.
Foi um presente.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

O caos da rosa.


Olha lá! Até as pétalas em guerra.
Guerra pra ver quem vai sentir a terra
Mas conforme o caos come
a rosa
morre.
A pétala
cai.
E então anarquia se faz, meu pai!
Quando se vai, se cai, se ganha.
Nunca vi tanta barganha.
Se ganha, porque mesmo morta
a delicada pétala torta
abre uma porta pra sentir a terra.

Acorda...

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Sanduíche de migalomorfa.

Estava posto em cima da mesa. E o garoto não sabia seu gosto.


Despertou ao amanhecer, ficou na cama por alguns minutos organizando seus pensamentos.
Não rezou, não agradeceu, não acreditava... E ainda ria de quem por ele orava!
Pisou no chão gelado, perdera a meia em meio à cama.
Se arrastou pelas paredes, com um olho aberto e outro fechado, estava acostumado...
Apoiou-se na pia, olhou-se no espelho, não gostava do que se via.
Cadê a luz que irradia?

Um reflexo saía de seus olhos verde-água.
Deixava correr a água pelas mãos quentes.

Sorriu, só pra ver se ainda tinha todos os dentes.

Seu braço magro, coberto por hematomas, só tinha força pra estender uma rosa a quem amava.
A quem por ele orava e chorava, por ele acreditava.

Vestiu sua camisa amarrotada e seguiu rumo a cozinha bagunçada.
Morava sozinho porém, acompanhado.
Morava sozinho em seu quarto, morava sozinho em sua vida.
Uma vida que não tinha vida, uma vida morta já que era um morto-vivo.

"Bom dia!" - era o que o bule o desejava.
"Bom dia só se for pra você, bule estúpido!"

Olhou para os armários e notou que estavam todos fechados. A louça, lavada. A pia, arrumada.
Fez uma cara de espanto e seguiu até a lavanderia. Roupas passadas, camisa engomada, e um bilhete. "Não coma o sanduíche. Com amor, Alana."

"Ora, que inferno. Quem cuida de alguém aqui, sou eu!"

Cuidava de Alana como se fosse sua filha. Mas não cuidava de seu eu, de seu seu.

Voltou para a cozinha e lá estava, sobre um pires amarelo, o sanduíche.
Com a boca cheia d'água, amarga, cortada e tomada por curiosidade, deu uma dentada.

"Saboroso..."

O gosto final era fatal. Um anestésico mortal.
Sanduíche de migalomorfa.
Morreu por causa do veneno.

Viu sua vida em dois segundos.
A infância rolando junto com o feno, a adolescência se apagando junto com seus cigarros e...


Alana, Alana, Alana, Alana, Cuidado, A lama, A ama.